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SOCO NO MURO E OS SEUS NOVOS PRODUTOS!

 

Bom estar novamente com vocês, amigos e gente que acessa o site TORDESILHAS, abrangente, que enfoca todos os assuntos palpitantes da semana, mas também dá um tempo para curtir literatura, arte e a vida.

A edição de hoje traz algumas das mais recentes produções desse poeta e amigo de vocês.

Ao contar os textos deparei com o número 7. Nos anos cinquenta e sessenta só acreditávamos no que a Revista O Cruzeiro dizia e publicava; depois o Jornal Nacional tomou esse lugar até cair no mais absoluto descrédito para grande parte da população. Hoje o negócio é consultar o Google. Foi o que fiz ao deparar-me com o número 7. Eis o que encontrei:

“Significado do Número 7

O número 7 é o algarismo que representa a espiritualidade. O 7 é um numero muito marcante na numerologia, é o número da perfeição, que integra o mundo, é o símbolo da totalidade do Universo em transformação. 7 são os dias da semana, as cores do arco-íris, as maravilhas do mundo. Está ligado à introspecção, ao ocultismo, à pesquisa da espiritualidade, à reflexão que leva à sabedoria. A busca por aquilo que não se vê, a meditação, o descanso, a busca da paz interior. É o número que aproxima o homem de Deus.  Descubra qual o significado do número 7 na Numerologia!”

Mas que coisa! Totalmente diferente do meu tempo de criança. Deus me livre de chegar em casa contando história ou dando alguma resposta que envolvesse o número 7, principalmente em questões de dinheiro. 7 é conta de mentiroso, sentenciava minha mãe, dona Joana, mas com o pseudônimo de Joca (notaram como mãe de escritor não tema apelido) e eu que fosse procurar um número verdadeiro para por na conversa. Creio até que cheguei a apanhar por causa desse número fatídico na infância, mas que hoje se anuncia tão divino e promissor!

Aqui estão 3 pequenas fábulas, do livro inédito que deu nome a essa coluna, SOCO NO MURO, e 4 poemas do livro de poesias, também inédito, DIURNIDADE.

Bom finde... certo, biscoito

 

AS SECRETAS RAZÕES DA LOUCURA

         Havia um Reino Encantado, num lugar de todos desconhecido, cujo Rei era um louco.

         Seus editos, determinações e leis eram frutos de pequenos e esparsos momentos em que lhe sobrevinha a sanidade – diziam.

         Nenhuma lei era injusta. Nenhuma determinação era contrária a qualquer lei da natureza ou dos homens. E os editos agradavam a súditos e vassalos, religiosos e militares, artesãos e comerciantes, nobres e plebeus, ricos e pobres.

         Era um Reino feliz onde todos eram felizes.

         O que ninguém sabia, e jamais poderia sequer imaginar, era que leis, editos, decretos e determinações, embora fossem promulgados naqueles instantes em que a razão dominava, eram todos concebidos, pensados, criados exatamente durante a sua loucura.  

 

NUVENS ESCURAS TOLDARAM O CÉU

         Numa radiante manhã de sol, o viajante e peregrino seguia por uma estrada florida e perfumada.

         Podia ouvir, mesmo que fosse ao longe, o cantar mavioso de algum pássaro, o sussurrar das águas de um riacho, pelo qual passou com o coração cheio de doçura e encantamento, e os silvos de folhas nas árvores trazidos pelo vento.

         Caminhava contrito e alegre: seu cajado era sua única arma, com a qual enfrentaria alguma fera que aparecesse repentinamente a sua frente, e levava também seu farnel composto de algumas frutas, mel e fatias de pão integral.

         Enquanto andava, seu passado, em forma de lembranças, emergiu de dentro de si trazendo-lhe preocupação e desassossego. A estrada ficava cada vez mais estreita, parecia-lhe que o céu escurecia e que logo uma tempestade o alcançaria. E até murmurou em voz baixa para si mesmo:

         – Nuvens escuras toldam o meu céu...

         Mas não havia nuvens, muito menos escuras. Ao olhar novamente para o céu, e para fora de si, a manhã continuava radiante e alegre e o sol brilhava em todo o seu esplendor.

         E soube: aquelas nuvens escuras eram apenas os seus pensamentos.

 

OLHANDO ALÉM DAS APARÊNCIAS

         Ao sentir que o peso dos anos lhe curvava a espinha e que o seu tempo de provações na terra se esgotava, o homem subiu a montanha.

         Procurava no alto daquele monte uma espécie de sábio e vidente que ali habitava. Era, como se diz, um perito, um especialista em desvendar o ser humano, mesmo que este procurasse guardar, da forma mais secreta, certos segredos.

         Procuravam-no todo tipo de pessoas: ricos, pobres, gordos, magricelas, angustiados, confiantes, humildes, orgulhos, desesperados e esperançosos. Mas todos com um único objetivo: ouvirem o veredito a respeito de si mesmos e qual destino teriam, após serem carregados pelos braços da morte, para o lado invisível do mundo e das coisas.

         Seu método era simples e seguro. Não fazia perguntas. Apenas olhava fixamente, por alguns segundos, o visitante para ver se este baixava ou desviava o olhar do seu, ou se permanecia também olhando-o firmemente.

         O dom especial do vidente é que aquele que o consultava via-se a si mesmo no olhar do sábio, e passava a se reconhecer como realmente era por dentro, sem máscaras ou fingimento.

         Pois, sentenciava o eremita do alto da montanha: “nem todos se reconhecem ao olharem-se no seu espelho interior”.

 

CANÇÃO DO EXILIO Nº 2

 

Nuvens tão brancas em céu tão dulcíssimo,
tanto azul sem razão para enfeitar os montes,
nem bem entrara eu neste Maranhão de ontem,
onde o tempo do sagrado e do divino
são bandeiras nutridas de passados.
Fui e voltei a nado nos braços da morte,
como fez o grande poeta Antônio Gonçalves Dias,
para cantar palmeiras, xô, passarinhos!,
assim começa esta canção do exílio.

Sim, os poetas exilaram-se todos pra dentro de si mesmos.
Nenhum sabiá cantava à toa,
nenhuma bandeira balançava-se ao vento.
É tempo de contar destroços, resgatar tesouros de navios
saqueados desde a Ponta da Areia
até outros mares mais bravios.

Piratas de gravata e notbooks,
com ligeiras noções de economia,
pegaram seu butim e foram embora,
deram à vila de novos Dons Diogos:
deixaram-nos a Madre Deus e bumbas rotos.

Minha terra tem palmeiras
e o meu exílio é aqui.

 

POEMA À MODA GAUDÉRIA

 

Abandonei o cigarro

Quase cego pela fumaça

Que subia de uma praça

Para o céu da minha boca.

 

Abandonei a cachaça

E a tal da caipirinha

Outras drogas, coisas finas,

A maconha e a cocaína

 

Abandonei São Domingos

Pedaço da minha vida

Abandonei meu estado

O saudoso Maranhão

 

Era esta a minha sina

Ser um careta doidão

 

ELAS, AS AMARELAS

 

Borboletas amarelas voam ao vivo
para nos distraírem da dor

e dos impulsos assassinos.


Elas voam alegres

na manhã verde e cinzenta

com suas asas de tombos.

 

Nós também fazemos assim.

Voamos: dos problemas

e das auroras de chumbo.

 

As borboletas amarelas

que jamais esqueçorevoam

e vivem na Maria da Eva.



OS INDULGENTES

 

Foram chegando do norte, e das profundezas;

foram chegando do leste, e dos seus alaridos;

e vieram do oeste, e os incomunicáveis;

os do sul vieram, transidos de frio.

 

Agora estão ali, todos, 3 vezes sedentos

e amargurados não ouvem o canto que os salva.

Vigiam numa vigília insone.

Padecem como vós uma doença de Lázaro,

não de chagas, mas de ouvidos moucos

às profecias da fala.

 

Intrusos, ladrões, homicidas:

as homilias dominicais são os verbos que os condenam.

Disparam contra vós flechas sangrentas,

envenenadas no pó, sem as angústias que calam.

 

Raimundo Fontenele é escritor com vasta produção literária no ramo da poesia. Foi um dos integrantes da Antroponáutica, movimento literário importantíssimo responsável por renovar a cena literária do Maranhão no inicio da década de 1970.

 

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