Bom estar novamente com
vocês, amigos e gente que acessa o site TORDESILHAS, abrangente, que enfoca
todos os assuntos palpitantes da semana, mas também dá um tempo para curtir
literatura, arte e a vida.
Esta semana, santa por sinal, vou comentar a posse
de Gilberto Gil na Academia Brasileira de Letras e começo lembrando a todos, e
ao próprio cantor baiano, os versos que ele cantou: xô, chuá, cada macaco no
seu galho...
Não acho que o galho da Academia seja o ideal, não
neste momento, para o Gil pendurar-se e balançar-se com a turma que o
acompanha, com mais afinco, desde que ele pilotou o Ministério da Cultura, alí
implantando uma república de favores, benesses e muita grana para os amigos do
Reizinho Lula da Silva, via Lei Rouanet.
A partir daquele não tão longínquo 2003 foi-se
costurando com fios d’ouro o fardão acadêmico que ele agora ostenta e veste.
Com osamigosCaretano, Paula Lavigne, Chico Buarque e outros mais foi criado o
grupo Procure Saber, saber o quê? O que o Lobão falou. E o Lobão falou que esse
grupo de certa forma controlava muitas coisas, inclusive shows de cantores que
desejassem ir fazer no exterior precisava de uma espécie de crivo de aprovação
do tal Procure Saber.
É muita treta porque esses baianos são
inteligentes e têm muita imaginação. Sempre arrancaram leite de pedra. E tem a
Ivete e Mercury pra darem aquele salvis geral.
A ida do Gilberto Gil pra Academia se insere
nesses eventos, gritarias, a Globo ali junto, a mídia careta e esquerdista
apoiando, porque a posse se tornou em mais um evento político, nada de
literatura e arte, pois quem leu nas entrelinhas sabe que aquilo ali era mais
um episódio da série FORA BOLSONARO.
O articulador de tudo foi o atual, vejam só,
presidente da ABL, jornalista Merval Pereira, pró MDB, pró Temer, e que na
entrevista em que o Bolsonaro acabou com a respeitabilidade da própria Globo e
de seus jornalistas militantes, quando Merval foi tentar lacrar pra cima do
Mito, ele disse ô Merval você é daqueles que criam empresas para receber a
grana que a Globo te paga com CNPJ e não com CPF, pois isso alivia o pagamento
do Imposto de Renda.
É disso que se trata a tal posse na ABL: Gilberto
Gil, Globo, Merval Pereira, Fora
Bolsonaro, só faltou a Daniela Mercury gritar pra todo mundo ir pra casa do
carvalho, velhinhos acadêmicos de cabelos brancos meio que cochilando, meio que
babando na gravata e se a Ivete gritasse ei, Bolsonaro vai tomar no cu, estaria
completo o enredo desse moderníssimo Samba do Crioulo Doido que atendeu naquele
noite pelo pomposo nome Gilberto Passos Gil Moreira.
POR QUE UM CARA QUE ESCREVE OS VERSOS ABAIXO
NÃO MERECE IR PRA ACADEMIA?
SALMO DA RENUNCIAÇÃO
Porque não me sinto humano,
mas um animal na chuva,
essas lágrimas divinas me assassinam.
Fere meu calcanhar de Aquiles
a espada de justiça e luz,
rubra de sangue.
Ó Deus, no teu altar
deposito estas oferendas
de quem tão pouco Te amou,
Te serviu, Te conheceu,
de quem tão pequeno
carregou tão grande soberba.
Por isso não me convidas a Tua mesa,
não para punir-me e nem para vingar-se,
mas porque fui eu que escolhi
esse banquete nas trevas.
SALMO DA LEOA FAMINTA
Nem predador algum
nem o sinal mais leve do caçador tirano
alcance aquela que é o encanto da floresta.
Felina linda em seu passeio matinal
entre as ervas do caminho.
Canto para louvar seus passos,
sua nobre elegância de animal e fêmea
que contra a parede nos põe,
com seu olhar de frio e prata
que ergue suas patas de mãe a defender-se.
Canto o murmurar da selva,
a chuva fina,
suas tetas prenhes do leite primevo,
o elixir da vida com que sustenta a prole.
E seu sustento é a fome,
o descompensado amor,
o desabrigo,
a ferida,
a sede de viver mais longe longe
muito longe.
Fome não passarás,
sede não sentirás,
só o desejo do salto sobre o que esperas,
e quando anoitece dormes
quase na mansidão do que ainda é fera.
SALMO DO URSO APAIXONADO
Tristeza, enfim, doeste em mim,
como se eu fosse um urso no começo.
Ele que nas regiões inóspitas
hiberna seus verões e invernos
de mansa fera:
comendo o que tem ali,
seja fruto, erva, outro animal
ou primaveras.
Nas cavernas se esconde
e no seu cismar sombrio
anseia mais montanhas,
mais neve nos seus dias.
Beleza plena, macia, acasalante,
foge também mesmo que se perca
na escuridão dos becos
que também existem nas florestas.
Toque de pluma, olho de beija-flor,
ferino às vezes, às vezes perdedor,
entre o silêncio e o sonho,
vigia o amor que lhe foi prometido.
Porque, mesmo que não se saiba ou diga,
os ursos sofrem, choram e desesperam-se,
os ursos também amam, sim senhor.
SALMO DAS OFERTAS HUMANAS
Nada pude comprar. Nada pude colher.
O que trago são lágrimas não choradas
que secou-as o vento da mocidade.
Da tenra idade, nada. Só lembranças.
Posso ofertar meus sonhos?
Serão aceitas, por acaso, as palavras inúteis,
os gozos frívolos, a ânsia febril?
As mentiras, as desculpas esfarrapadas?
O jejum forçado e a abstinência vazia?
Não, né? Nada disso é aceito
porque a Deus não se oferece esmolas,
e não adianta orar diante do trono caído.
Não. E não. E não.
O que posso ofertar é a mim mesmo
um ser sem nome e esquálido,
pálida imagem de quando estou de joelhos,
projetos do que eu teria sido e nunca fui,
a elegância febril dos perdedores.
Tudo isso e mais o desprezo
ao luxo e ao fausto terreno,
o desmedido amor por si mesmo,
sim, tudo isso são oferendas humanas
desprovidas de espírito
que nos diminuem aos olhos de Deus.
Nada pude comprar. Nada pude colher.
O que trago são lágrimas choradas
ao longo de uma vida inteira.
Secou-as o sol da madurez.
Da tenra idade, nada. Só lembranças.
SALMO DAS ANTIGAS FERIDAS
Como é difícil, Senhor, chamar teu nome
se a minha vida agora é só desprezo
e feridas antigas que ainda sangram
são as chagas que da manhã à noite
verteram o sangue de um embriagado.
Como é terrível, Senhor, pedir perdão
pra tantos males dos quais não há remorso,
nem arrependimento, nem uma lágrima
qualquer que os redima
e sem que caiam no esquecimento.
Apagar meu nome do livro da vida
e me tornar cativo da esperança
é tudo que me resta.
E dobrar os joelhos quando sinos dobram
e me tornar ninguém, sim, é o que resta.
Cativo, sem remorso e esquecido,
mesmo assim jamais esquecerei
que és meu único Senhor,
o meu pastor do salmo 23,
e o Deus mais vivo que eu posso ter.
Cura e perdoa, esquece e ama,
chama por seu nome entre chamas
que queimam e purificam
as feridas e a vida que tiveste.
E curvado, assim, diante Dele, ora.
SALMO DAS AMARRAS TERRENAS
Estou preso a você por esse fio de carretel
que me enovela num labirinto,
preso ao gosto da comida, um glutão
nas amarras de uma sede infinita.
Nenhum alguém, nenhum ninguém,
e todos seguram minha mão
para que eu não encontre a porta e a saída,
para que aqui permaneça e sinta desejos.
Uma bailarina, a outra, uma benzedeira,
e a viúva, e a bastarda e a velha gula
tudo volta até mim, e me prende às amarras
das coisas mais terrenas e previsíveis.
Como ter essa argila entre as mãos
e, ao moldar o barro, eu moldasse
a mim mesmo, e me prendesse em formas
e em enigmas que jamais decifrei.
É a terra e seus contornos
que limita este corpo e a ânsia que carrego.
E olho carneiros no céu feitos de nuvens
e as montanhas de onde descarrilho.
SALMO DIVINO
Um dia lindo!
Uma manhã de dezembro aberta aos mitos.
Nem ao sol, nem à plumagem das aves,
nem ao seu canto ficamos indiferentes.
Mesmo o olhinho de um pequeno beija-flor
brilha sorrindo.
É plena a tarde!
E a primavera traz seus anjos e seus ritos
de amar sem meias medidas.
A tudo o amor se permite com abundância,
e com leveza chama para si os olhos no alto
e as mãos em pura prece.
Que noite feliz!
Quão grande amor divino desce sobre a terra!
Esta vida é um êxtase e, a cada minuto,
exulta e pulsa no coração das coisas
mais divinas, que sobre nós se derramam
como cascatas de luz.
SALMO DE DAVI PARA SI MESMO
Não sentirei opróbrio nem vergonha
de pedir ao Senhor
que me aparte da angústia e dos lamentos.
Afastei-me e fugi das glórias desse mundo
tentando ser feliz como os passarinhos
que com alegria cantam e louvam o Criador.
Não poderei mais andar nas fendas do abismo
e meus passos não me levem
onde caminham as feras.
Todo ódio temerei pois os meus inimigos
avançam como cães para devorar-me
e pequeno como sou só o Senhor me salva.
O que fiz no passado e os erros presentes
são correntes que me arrastam
para além das minhas forças.
É ao Senhor que recorro quando fraquejo
e meus pés pesam como chumbo
quando no pântano afundo.
Outras veredas existem onde estarei perdido
por mãos torpes e infiéis
que ali, sem piedade alguma, me largaram.
Nem ave do céu, nem nave da terra
me socorreram nos tempos de infortúnio
nem me levaram a voar entre as estrelas.
No chão estava e no chão permaneci:
apenas meu pensamento se elevava
e em meios a soluços chegava ao Senhor.
E o meu Deus viu que meu clamor
só trazia verdades, mesmos as mais dolorosas
e por sua vontade levantou-me das cinzas.
“Agora, luta!”, sentenciou Ele
e me tornou mais forte que o mais forte
e bravio dos animais terrestres.
E preparei-me para uma guerra
contra mim mesmo, que era travada
em meio às batalhas e às fadigas do dia.
Ele tornou-me único para que, sem vaidades,
alcançasse as alturas que buscava
e me tornasse um servo abençoado.
SALMO A SALOMÃO
“O mundo a seus pés” era um imenso,
exorbitante desejo e orgulho.
Todos um dia serão tentados
por essa moda e luxo
que se tornarão luxúria e perdição.
Plumas, ouro, diamantes,
tudo que faísca e ofusca os nossos olhos,
a prata fina e o brilhante dos ossos
que nos fazem cair de joelhos,
essas coisas pesam, e como pesam.
E as mulheres. Ah, as mulheres.
Todas juntas, com seus sextos
e até os nove sentidos,
preparadas para embriagar-nos de prazer,
e embriagá-lo, e embriagar-me.
Mas, com sabedoria, foi juntando as pedras
mais preciosas e tábuas das leis mais severas,
mais duras, mas também as mais justas,
desde quando jovem príncipe
até às calendas de um velho e sábio rei.
Reinar e resignar-se.
Reinar e governar tesouros.
Reinar e satisfazer a todos.
Reinar e proferir sentenças
caídas do mais altíssimo dos tronos.
Tudo isso porque o deus menos vingativo
permaneceu entre os homens,
qual uma espada de luz
que sabe separar o joio do trigo,
porque, reconheço, és o Senhor dos Senhores.
SALMO DAS ÁGUAS
Primeiro são as águas da iniciação.
“A bolsa estourou”, diz a Mulher
com a ânsia e a alegria
de quem também vai fazer parte da criação.
Aí a gente chora, e as águas
se tornam lágrimas que derramamos
pela vida afora.
“Eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do
Espírito Santo”, sim, são as águas da remissão
que amparam nossa dor
e o nosso sofrer enriquecem,
sem nenhum vil metal e sem livros de cura,
mas o que espantam em nós, e curam,
vive pra sempre, e espera.
SALMO DO RENASCIMENTO
Do olhar de alguém a luz cai
sobre a minha estrada iluminando-a,
e em plena escuridão renascem
o ócio
a flor
o beijo
a música
o abraço
e a própria magia do renascimento.
Ergo-me para ver o sol que cai
sobre a terra ainda noturna,
e dos seus raios vejo surgirem
o ouro
a alegria
o amor
o riso
o sonho
e até o instante do meu nascimento.
Só isso me bastaria, Senhor!
Mas tem a chuva
e os meus desejos;
mas tem a lua
e o que não vejo;
e tem a mulher
e os seus alvos seios,
o meu apetite e seu doce enlevo.
Há ainda seus braços
e o meu caminhar quase trôpego.
Isso fez o Senhor em mim
e multiplicou-me a vida.
Diante da sarça ardente
me colocou em silêncio
e cerrei meus dentes
para que ela não fosse.
Sim. Não fosse.
E não me deixasse sozinho.
SALMO DAS OLIVEIRAS
“Puerihebræorum,
portantes ramos olivarum,
obviaverunt Domino,
clamantes et dicentes:
Hosanna in excelsis”.
Também entrei na cidade aberta,
no meu jumentinho,
portando ramos e palmas nascidos do coração,
em uma manhã chuvosa,
quando o vento úmido balançava
as verdes folhas das palmeiras.
Ao Senhor, todo o meu ser de inocente criança,
sem o pecado da culpa, clamava
para que me desse veredas de salvação,
e me desse alegria, e as horas amargas
deixasse para outros dias
para quando eu crescesse e fosse gente.
Naquele tempo, não. Eu era só um menino
entrando naquela terra estranha,
onde as coisas se moviam diferentes
e invisíveis mãos, a de Deus e a do destino,
semeavam em mim seus grãos e mistérios.
E eu cantava e vivia a toa.
Sim. Entrei naquela cidade
para ouvir e cantar lamentos
no diário aprendizado
de que vigiar e orar é para todo o sempre.
Deus não é um estranho no nosso ninho,
nós é que fugimos, aves de asas tortas.
Que aprendizado diário?
Dar com a mão direita e com a esquerda
furtar o fruto alheio.
Cuspir na face de quem afagou com doçura
os nossos longos cabelos.
Profanar e zombar de quem é nosso alimento.
Sal da terra!, salgas a minha vida
e as chagas que se abrem
são como dias de luta e suor que não findam.
noites para cegos,
noites de nunca mais.
Pregado numa cruz, ouvi o galo cantar
às 16:58, e cantou uma, duas, três vezes,
o suor escorria do meu rosto
como se fosse um banho de sangue,
aí arrancaram-me da cruz
e me deitaram no cimento frio.
Todos meus ossos tremiam.
Todos meus nervos inquietavam-se.
Todo meu corpo enrijecia.
Ouvia ao longe os cânticos da sagração
que animavam a minha vida
e me ressuscitavam entre os mortos.
Todos os meus sentidos embotados.
Toda a cupidez da carne tremia.
Todos os meus órgãos latejavam.
Mas a quietude e a paz do teu sacrário,
a pureza e mansidão do teu nome, Senhor,
extinguiam a sombra entre meu olhar e tua luz.
Eu, um Raimundo perdido nesse mundo.
Eu, um Nonato, só por teu merecimento.
Eu, um Fontenele, que tornaste fonte.
E um Oliveira, qual um ferreiro
fundindo o ferro, que abraça sua profissão
no fogo e na poesia que vem do chão.
Hosana a São Domingos
e a outras cidades dos mapas,
que me acolheram e de onde fui expulso
para se cumprir de Adão e Eva a profecia:
se houve queda e se desci ao inferno
talvez possa voltar um dia ao paraíso.
“Os filhos dos hebreus,
portando ramos de oliveira,
clamavam dizendo:
bendito o que vem
em nome do Senhor,
Hosana nas alturas”.
Raimundo Fontenele é escritor com vasta produção literária no ramo da poesia. Foi um dos integrantes da Antroponáutica, movimento literário importantíssimo responsável por renovar a cena literária do Maranhão no inicio da década de 1970.
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