1.
Introdução
Em que pese a síndrome de burnout não se tratar
de um assunto novo, os impactos da pandemia da COVID 19 parecem ter trazido à
tona esse tema. As evidências, sobretudo nos profissionais da área da saúde, mostraram
as consequências maléficas de um trabalho físico, mental e emocional levado à
exaustão.
Mas a síndrome de burnout não atinge apenas enfermeiros,
médicos e profissionais de saúde em geral; jornalistas, advogados, gerentes de
bancos, bombeiros, policiais, empreendedores e basicamente todos os
profissionais que se veem diariamente à busca do alcance de metas e cumprimento
de prazos parecem ser os principais atingidos.
O que significa exatamente essa síndrome? É
possível que a reconheçamos em seu início? Quais os principais sintomas? A que
o profissional e as organizações devem atentar? Como especialista em Gestão de
Negócios e em Gestão de Pessoas em Ambiente de Mudanças, e como consultora em
Gestão de Pessoas, vamos abordar o assunto com foco em nossa área de atuação.
2.
A Síndrome de Burnout
Pesquisa realizada pela
ISMA - International Stress Management Association – associação sem fins
lucrativos da qual o Brasil participa juntamente com outros 11 países (
Alemanha, Austrália, Espanha, Estados Unidos, França, Holanda, Hong Kong,
Índia, Inglaterra, Japão, Rússia), aponta que cerca de 32% dos trabalhadores
brasileiros sofrem da síndrome de burnout; e que o Brasil ocupa o segundo
lugar, dentre os países pesquisados, com maior incidência de burnout, perdendo
apenas para o Japão, com 70%. Surgida em 1973, a ISMA é considerada a única
associação com caráter internacional voltada à pesquisa e ao desenvolvimento da
prevenção e do tratamento de stress no mundo. (ismabrasil.com.br)
Reconhecida em 2019 pela OMS – Organização Mundial da Saúde – a síndrome de burnout, que se caracteriza por um esgotamento físico e mental, deverá passar a constar oficialmente como uma doença relacionada ao trabalho, a partir de janeiro de 2022. Entretanto, já há condenações a empresas em decorrência dessa síndrome de esgotamento profissional, como mostram algumas notícias.
Trabalhador com síndrome do esgotamento profissional ganha direito à indenização por dano moral.
(https://www.trt7.jus.br/index.phpoption=com_content&view=article&id=3974:trabalhador-com-sindrome-do-esgotamento-profissional-ganha-direito-a-indenizacao-por-dano-moral&catid=152&Itemid=887)
Mantida indenização a bancário aposentado aos 31 anos por síndrome de burnout.
(http://www.tst.jus.br/noticiadestaque/-/asset_publisher/NGo1/content/id/24425668)
A palavra síndrome vem da diversidade de
sintomas e características. No caso do burnout, eles podem aparecer por meio de
insônia, dores no corpo, irritação, tristeza, dificuldade de se relacionar,
isolamento, sentimento de desvalorização pessoal, baixa autoestima, cansaço
físico e mental, lapsos de memória e diversos outros, que acabam por levar a
pessoa ao que, em metáfora, muitos comparam ao fósforo que queima até se apagar
por completo. Portanto, o quanto antes conseguirmos reconhecer os sintomas, em
nós mesmos e nos outros, mais fácil se torna o tratamento e mais chances se tem
de evitar chegar à exaustão e ao colapso.
3.
O impacto do burnout nas organizações
Sem qualquer pretensão
de esgotar a relação dos impactos negativos, optamos por destacar três deles.
Ø Financeiro
No item anterior, mostramos notícias
referentes a indenizações decorrentes de decisões judiciais relacionadas ao burnout.
Os valores das condenações mencionados nessas notícias foram de R$ 90.000,00
(noventa mil reais) e de R$ 475.000,00 (quatrocentos e setenta e cinco mil
reais), respectivamente. Esse é um impacto direto sobre o financeiro de uma
empresa.
Ø Responsabilidade
social
A sociedade cobra das organizações postura
ética e responsável em relação a seus colaboradores, suas famílias, comunidades
e sociedade. E muitas decisões de compra de produtos e contratação de serviços
levam em consideração o que se chama de balanço social. A análise da
responsabilidade social da empresa implica no impacto sobre o financeiro.
Ø Clima
organizacional e produtividade
O clima organizacional é algo subjetivo,
relacionado à forma como as pessoas que compõem a organização a enxergam, sob
vários aspectos. Casos de colegas de trabalhos enfrentando transtornos
decorrentes de sua atividade, certamente refletem de maneira bastante negativa
nas expectativas que a equipe gera. Sentimentos de medo e angústia ganham
espaço, além da falta de expectativas positivas e da desmotivação; e é óbvio
que o reflexo sobre a produtividade não pode ser positivo. Por extensão,
novamente temos aqui impactos sobre o financeiro.
4.
O que pode e deve ser feito
Em nossas abordagens costumamos considerar
a responsabilidade mútua: empregado e
empresa. Não podemos mais pensar em posições opostas; mas, sim, complementares,
onde ambos ganham.
4.1 Empregado
O psiquiatra Daniel Barros, entrevistado
no programa Bem Estar, que foi exibido em 31 de maio de 2019 pela Rede Globo,
alertou para as maiores chances de desenvolvimento do burnout em trabalhadores
“perfeccionistas e idealistas”. E o neurocirurgião e professor da Faculdade de
Medicina da USP, Fernando Gomes, numa entrevista ao Drauzio Varella , em
novembro de 2019, explicou que a estafa mental seria um estágio anterior ao Burnout,
além de ressaltar que muitas vezes “a pessoa enxerga todo o seu valor na
profissão ou na atividade e, de repente, vê que não tem o retorno”.
Quando falamos de nossos limites, temos a
consciência que muitos de nós não sabemos quais são, até que nos submetamos a
consequências sobre os excessos. Entretanto, há de se tornar essa busca pelo
autoconhecimento um desafio diário. Leituras e vídeos abordam o assunto e os
coaches, por serem profissionais dedicados a esse desenvolvimento, podem dar o
apoio necessário.
Ainda que valorizado e incentivado pela
organização, o empregado deve estar atento ao excesso de atividades
relacionadas ao trabalho e à necessidade de equilíbrio das diversas dimensões
da sua vida – espiritualidade, trabalho, financeiro, realização pessoal, saúde,
relacionamento social, lazer, relacionamento amoroso e desenvolvimento
intelectual. Um “sprint” de vez em quando é benéfico, mas há de se estabelecer
o equilíbrio e, portanto, essas situações não podem se tornar corriqueiras.
Quem nunca perdeu a hora do almoço um dia na vida? O que não pode é
frequentemente perdê-lo! O estresse, ao contrário do que muitos pensam, até
certo ponto é salutar; ele te movimenta. Mas sem limite pode te levar à
exaustão.
4.2 Organização
Simon Sinek, autor do livro “Comece pelo
Porquê”, diz: “100% dos clientes são pessoas. 100% dos funcionários são
pessoas. Se você não entende de pessoas, você não entende de negócios.” Eu
penso que devamos refletir mais sobre isso. E se você não tem condições de ir a
fundo nesse aspecto, eu entendo; afinal, são milhares de preocupações e
atribuições que temos, enquanto empreendedores e empresários. Mas ao menos dê
uma especial atenção a isso e busque quem pode lhe apoiar. Como esperar que sua
empresa preste um serviço de qualidade se as pessoas que dela fazem parte não
estão bem? Como almejar um atendimento de excelência, se o empregado, como
cliente interno da sua empresa, não considera ser bem atendido?
Vamos relacionar alguns pontos, frutos dos
nossos estudos, da nossa experiência de mais de 20 anos como gestora, bem como da
nossa experiencia em treinamentos e consultorias. Isso inclui um olhar voltado
ao coletivo e outro ao individual.
Ø Invista
em contratações mais assertivas, que consideram a compatibilidade entre as
culturas do empregado e da sua empresa, bem como o perfil de comportamento do
empregado versus as funções que terá que desempenhar;
Ø Promova
o acolhimento das pessoas e o espírito de pertencimento. Preocupe-se
efetivamente com as pessoas, desde o primeiro contato delas com a empresa;
Ø Desenvolva
lideranças verdadeiras; não chefes disfarçados de líderes. Os líderes são os
embaixadores da cultura da sua organização; eles são o exemplo às pessoas da
sua equipe;
Ø Adote
formas claras e transparentes de feedback e de avaliação;
Ø Invista
em treinamentos que provoquem o verdadeiro desenvolvimento pessoal e
profissional. Estimule a busca de propósito e o desenvolvimento da autoestima e
da resiliência;
Ø Reconheça
e valorize, lembrando que as pessoas não veem o reconhecimento da mesma forma;
Ø Respeite
os horários de trabalho estabelecidos, o que inclui a comunicação por whatsapp e
por e-mail;
Ø Entenda
que as pessoas que trabalham com você, assim como você, precisam equilibrar as
diversas dimensões de suas vidas. Aliás, se você prestar atenção, vai ver que o
burnout é um verdadeiro desequilíbrio e que, em muitas ocasiões, leva seus
melhores talentos;
Ø Efetue
pesquisas de clima organizacional de tempos em tempos e saiba os pontos de
força e de fragilidade, que deverão ser confirmados ou corrigidos,
respectivamente;
Ø Há uma
grande diferença entre investimento e custo. “Cuidar” sempre é melhor que
“corrigir”;
Ø Se
você não tem na sua organização quem possa se dedicar à gestão de pessoas,
considerando os pontos que acabamos de destacar e outros mais, invista em
consultorias, que podem diagnosticar e indicar as melhores soluções.
5.
A pandemia
A pandemia trouxe consigo o susto, o medo,
a ansiedade e a insegurança. Além disso, a grande maioria de nós precisou
experimentar uma forma de trabalho sobre o que pouco ou nada sabíamos – o home office
– e sem as condições necessárias para essa modalidade ser implantada e
utilizada com sucesso.
Situações adversas como a que estamos
passando exigem uma dedicação maior por parte dos líderes, em relação ao
entendimento de como se sentem e de como se sentem seus liderados. Liderar à
distância exige cuidados e habilidades específicas. E cada um apresenta uma
reação diferente diante do novo.
Embora ainda não tenhamos conhecimento de
pesquisas a respeito, a expectativa de aumento de acometidos pelo burnout
existe. E isso requer de todos nós atenção e empenho!
Diana Gaspar é consultora e especialista em Gestão de Negócios e em Gestão de Pessoa.
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